domingo, 24 de abril de 2016

A ultrassonografia e as glândulas adrenais em pequenos animais


Imagem ultrassonográfica da glândula adrenal esquerda normal de um cão.


As glândulas adrenais são glândulas que produzem hormônios como aldosterona, cortisol e adrenalina. A doença mais comum em cães que envolve as glândulas adrenais é o hiperadrenocorticismo (ou síndrome de Cushing). Nela, há liberação de altos níveis de cortisol, que levam a vários sintomas como polidipsia, poliúria, polifagia, abdomen abaulado, perda de pêlos de forma simétrica e bilateral, cansaço, entre outros.

Essas glândulas podem ser avaliadas durante o exame ultrassonográfico. A adrenal esquerda é mais fácil de se encontrar porque está um pouco mais caudal que a direita. O conhecimento da sua posição anatômica nos ajuda na hora do exame. Ela fica entre o rim esquerdo e a aorta, caudal às arterias celíaca e mesentérica cranial, cranial à artéria renal. Já a glândula adrenal direita fica cranial às artérias celíaca e mesentérica cranial e justaposta à veia cava caudal.

Na imagem ultrassonográfica, as adrenais têm a cortical menos ecogênica e a medula mais ecogênica. A adrenal esquerda tem uma constrição central e pólos mais arredondados, o que faz com que pareça um “amendoim” ou “haltere de academia”. Já a direita tem forma de “vírgula” ou “bumerangue”, com extremidades assimétricas.

E o tamanho? O que é normal? Existem vários trabalhos publicados falando sobre isso e valores normais para cães variam de 1 a 5 cm de comprimento e se aceita o diâmetro máximo transversal de 0,74 cm. Alguns cães normais terão valores um pouco mais altos que isso (lembrando que é uma curva padrão). E as adrenais direitas são, na maioria das vezes, menores que as esquerdas.
Nos gatos elas geralmente ficam em localização um pouco mais cranial que o pólo cranial dos rins e são mais arrendodadas ou ovóides. Valores normais variam de 0,45 a 1,4 cm de comprimento e 0,29 a 0,53 cm de diâmetro transversal.

No hiperadrenocorticismo hipófise-dependente, o achado clássico é aumento bilateral, simétrico e uniforme das glândulas adrenais (raramente pode ser unilateral – temos que diferenciar de neoplasia primária ou metastática; também pode estar dentro do normal, novamente lembrando que é uma curva padrão, se o normal daquele paciente era baixo, o aumentado dele pode estar dentro do valor normal). O fígado constuma estar alterado, com aumento de ecogenicidade. E claro, lembrar de associar esse achado com os sinais clínicos e alterações hematológicas, bioquímicas e endócrinas.

No hiperadrenocorticismo adrenal-dependente o aumento da glândula adrenal esperado é unilateral, ocasionado por neoplasias (massas arredondadas ou ovais que crescem de forma concentrica). A ecogenicidade pode variar de sólida a complexa. Pode ocorrer mineralização (especialmente em adenocarcinomas), e portanto, sombra acústica posterior (lembrando que 30% dos indivíduos normais podem ter mineralização na adrenal). A glândula contralateral pode estar normal ou diminuída. Os tumores de cortical são mais comuns em fêmeas e raças grandes.

Podemos ainda encontrar os feocromocitomas, que são tumores de células cromafins da medula da adrenal. São totalmente diferentes dos que causam hiperadrenocorticismo, esse tumor produz adrenalina. Os sintomas são inespecíficos. Na ultrassonografia podem ser vistos como uma massa unilateral, pode ter ecogenicidades variadas. Não costumam sofrer mineralização. Podem invadir vasos próximos e causar metástases. Porém, geralmente são achados incidentais. São difíceis de diferenciar do adenocarcinoma da cortical.

Resumindo, quando encontramos uma massa unilateral na adrenal, com a adrenal contralateral normal, podemos estar diante de feocromocitoma, neoplasia adrenocortical não funcional, metástase, ou até uma neoplasia adrenocortical funcional.

Se as glândulas adrenais estiverem pequenas, podemos estar diante do hipoadrenocorticismo ou casos em que há administração exógena de corticóides. Os valores mínimos normais não estão bem estabelecidos. Alguns sinais clínicos são anorexia, vômito, diarreia, perda de peso, entre outros.

Alterações em adrenais de gatos não são muito comuns.

Em humanos se faz punção aspirativa de adrenal, mas em animais se questiona a real vantagem do exame citológico nesses casos. Normalmente a quantidade de material é insuficiente e existe risco de hemorragia e crises hipertensivas na presença de feocromocitomas.

Glândula adrenal direita e sua proximidade à veia cava caudal.



quarta-feira, 13 de abril de 2016

A ultrassonografia e a gestação em pequenos animais

Quando se fala em ultrassonografia/ecografia, a grande maioria das pessoas pensa em gestação. Talvez pelo histórico do uso desse exame para acompanhamento gestacional na medicina humana. Em pequenos animais, também é muito importante. A avaliação da viabilidade dos fetos, tamanho da ninhada e predição do tempo gestacional pode ajudar na preparação do parto e possível necessidade de cesárea.

A confirmação da gestação pode ser realizada por volta de 17 dias após o pico de LH. Entre 20 e 25 dias, a única medida disponível para cálculo da idade gestacional é o diâmetro da vesícula embrionária. O embrião passa a ser visível a partir de 26 dias e a partir de então, o comprimento cabeça-nádega e o diâmetro do corpo podem ser mensurados. O diâmetro da cabeça (biparietal) pode ser medido com mais precisão a partir de 30 dias. Os estudos mostram que a precisão da predição de data de parto (65 dias ± 2 dias) é de 87%. A predição tem mais erro em raças pequenas ou gigantes e para isso se usa um fator de correção de mais um dia para as raças pequenas (<9kg) e menos dois dias para as gigantes (>40 kg). Os cálculos não são muito confiáveis no final da gestação, pois ocorre maior variação de crescimento fetal nesse momento. A observação do desenvolvimento dos órgãos do feto também pode ser utilizada para estimar a idade do feto.

O número de animais da ninhada é identificado com mais precisão com o uso da radiografia. A ultrassonografia costuma dar o número correto de animais em 65% dos casos. Os resultados são melhores quando a paciente fica tranquila durante o exame, quando o preparo antes do exame é realizado e há pouca quantidade de conteúdo no trato gastrintestinal, e claro, com a experiência do examinador. Vale lembrar que se houver morte fetal antes dos 37 dias, há reabsorção do tecido e o número da ninhada será modificado.

Muitas vezes, a paciente só é trazida para avaliação ultrassonográfica no momento das  complicações do parto. Nesses casos, a avaliação da viabilidade fetal e do sofrimento fetal (que leva em consideração a frequência cardíaca do feto) são essenciais para a decisão da conduta clínica do veterinário.

Diâmetro biparietal

Modo-M para aferição da frequência cardíaca fetal
Vesículas embrionárias




domingo, 10 de abril de 2016

A ultrassonografia e o Fígado


     A ultrassonografia é o exame de imagem mais frequentemente utilizado para avaliação do fígado. Às vezes recebemos pacientes com sinais que nos levam a suspeitar de doença hepática, muitas vezes sinais bem variáveis e inespecíficos (anorexia, perda de peso). Pode ser que tenha encontrado alterações hematológicas e bioquímicas compatíveis com doença hepática. O proprietário pode ter notado poliúria e polidipsia, ou a queixa é o aumento de volume abdominal. Nesses (e em vários outros casos), a ultrassonografia abdominal nos dá um suporte maior na tentativa de fechar o diagnóstico e oferecer o melhor tratamento ao paciente.

   A avaliação ultrassonográfica permite avaliação do tamanho do órgão, da arquitetura do parênquima hepático, dos vasos hepáticos e portais e do trato biliar.  É importante que o examinador seja qualificado para fazer a avaliação de todo o parênquima, conhecer o posicionamento do transdutor e suas angulações, saber ajustar o equipamento e conhecer as variações conformacionais do paciente.

   As alterações do fígado se dividem em focais/multifocais e difusas. Algumas alterações focais/multifocais são:
  • cistos
  • hematomas
  • abcessos
  • necrose hepática
  • hiperplasia nodular
  • neoplasias


   A mudança difusa do órgão pode ocorrer com aumento da ecogenicidade e diminuição da ecogenicidade.

    O aumento pode ocorrer em:
  •  infiltração gordurosa (lipidose, obesidade, diabetes mellitus)
  • hepatopatia esteroidal (medicamentosa ou hiperadrenocorticismo)
  • hepatite crônica
  • cirrose
  •  linfossarcoma

    A diminuição da ecogenicidade em:

  • hepatite aguda
  • congestão passiva (doenças cardíacas)
  • processos infiltrativos difusos: linfoma, leucemia, amiloidose.

    Também pode ocorrer ecogenicidade mista em:
  •  neoplasias difusas
  • síndrome hepatocutânea

    Na maioria das situações, recomenda-se punção aspirativa por agulha fina (PAAF) para análise citológica e/ou bacteriológica e esse procedimento pode ser realizado com mais segurança e precisão guiados por ultrassonografia. O acompanhamento ultrassonográfico periódico das lesões também pode nos dar informações valiosas sobre o diagnóstico, prognóstico e eficácia terapêutica.


    Logo posterei imagens, casos clínicos e artigos interessantes!

sábado, 9 de abril de 2016

Vários de vocês acompanharam toda ou parte da minha trajetória, mas alguns não a conhecem. Resumidamente, quando eu ainda estava cursando a faculdade de medicina veterinária na UFRGS já gostava muito de ultrassonografia, mas foi durante um estágio em 2006 que senti vontade de trabalhar com diagnóstico por imagens. Foi em Cleveland, Ohio que me encantei ao acompanhar a rotina de radiologistas veterinários num país onde a profissão é valorizada. Fiz meu estágio curricular, residência veterinária e mestrado na UNESP Jaboticabal ao lado de profissionais fantásticos que me ensinaram muito! Nesse tempo, também tive o prazer de acompanhar a rotina de um dos melhores radiologistas veterinários do mundo e de toda a equipe fenomenal da radiologia da North Carolina State University em Raleigh, NC. Também acompanhei um pouco da rotina de diagnóstico por imagem da medicina humana no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, SP. Acredito que a educação continuada é imprescindível para um bom veterinário. Poder vivenciar a experiência de profissionais qualificados é sempre um prazer. Agora inicio uma nova etapa em Canoas, RS e espero poder colaborar e acrescentar ainda mais conhecimento, sempre em busca da excelência que os nossos pacientes merecem.